terça-feira, 2 de dezembro de 2025

O Tarot e o Caso Sharon Tate


O sistema completo de A Cruz Celta com os mesmos arcanos que
foram interpretados por Patricia McLaine, prevendo o
crime terrível contra Sharon Tate em 1969.

O caso mais emblemático da história recente do tarot foi a leitura de *Patricia McLaine para uma amiga próxima da atriz Sharon Tate uma semana antes do seu assassinato, em começo de agosto de 1969. Ela já havia mencionado esta leitura no documentário Strictly Supernatural, de 1996, que está à venda na Amazon. O episódio referente ao tarot está disponível no YouTube, com o título Strictly Supernatural – A History of Tarot, e também aqui no Blog na página Vídeos. Achei a imagem da disposição completa (uma Cruz Celta) no grupo Tarot History, do Facebook, numa publicação de novembro deste ano. Há neste caso uma série de perspectivas sobre leituras de tarot que quero trazer para discussão aqui. Todas elas, porém, revelam o quanto os arcanos falam de modo diferente com diferentes pessoas. E isso não é exatamente uma constatação nova, mas é sempre surpreendente vê-la em ação! Costumo dizer que o processo mais rico para cada tarólogo é o de descobrir o que, afinal, as cartas querem com ele.

Neste caso em especial, a primeira coisa que chama a atenção é o fato de que Pattie, como era conhecida, estava lendo para uma pessoa e fez uma previsão para outra! Conheço inúmeros casos assim, e é mais comum entre os leitores psíquicos, leitores que agregam sua mediunidade às sessões de leitura das cartas, mas é importante salientar que não ocorre com todos os tarólogos. Os leitores psíquicos costumam sentir e prever fatos para membros colaterais de quem se consulta, de parentes à colegas de trabalho.  Não tenho registro na minha jornada com o tarot de algo assim ter acontecido, e sou grato por isso. Considero as leituras focadas no indivíduo mais eficientes e edificantes. Já escrevi aqui sobre os quatro tipos básicos de leitores de tarot, e deixarei o link do artigo no fim da página. Isso é um dos inúmeros exemplos de como pessoas extraem experiências diferentes na sua interação com os arcanos. Outro aspecto importante é que toda a carreira de Patricia McLaine foi focada na divinação. Não me interesso tanto assim por previsões, embora as faça na prática oracular diária, onde elas são uma parte e não o todo do meu trabalho. Nas minhas leituras eu entendo que as vivências do momento estão sempre requerendo do consulente um movimento para o seu crescimento e desenvolvimento pleno da consciência.

O Desenvolvimento do Tarólogo

Essa diferença, ou particularidade oculta, costuma frustrar os iniciantes na tarologia, pois na maioria das vezes eles chegam inspirados por um ou outro autor ou celebridade midiática que lida com o tarot, ou até mesmo por consultores específicos com quem tiveram contato com as cartas. Eles querem fazer como eles fazem, ler como eles leem. Ao perceberem que não o fazem ou que são bem diferentes isso os faz crer que sua visão dos arcanos está errada ou é limitada. Costumo dizer que não há certo ou errado, há diferenças. Isso, é claro, não exime que o leitor tenha autocrítica no aprimoramento do seu trabalho, ou de que esteja sempre estudando e aprendendo tanto com suas próprias leituras (anotando-as, relendo-as, e posteriormente verificando se a sua percepção sobre elas aumentou, mudou ou segue a mesma). Como também que invista tanto quanto o máximo possível em livros que possa encontrar na vida, e cursos que possa e queira fazer. Os três vetores do desenvolvimento nos quais qualquer tarólogo, ou qualquer outro intérprete de símbolos ocultos, deve focar são: a busca da precisão, da clareza e da fluência em captar e comunicar o que vê. Isso é fundamental! Depois deve priorizar a fidelidade ao que vê. Isso significa que deve sim usar seu cabedal de conhecimento, suas referências e experiências e vivências para deixar claro ao cliente suas visões. Nunca, nunca, porém, dê sua opinião. Diga o que os arcanos revelam. Eles são os portadores da sabedoria ancestral que se comunica com o cliente através dos seus símbolos, e você é um intérprete, ponto final. Ah, mas não tem como ser isento. Tem sim! Costumo dizer que se uma pessoa vai em mais de um tarólogo ela vai ouvir os mesmos relatos, porque a vida dela e uma só. O que muda são as referências, o padrão, a experiência, a cultura e desenvolvimento do próprio leitor. Isenção é sobre você entender que sua “opinião” é pura manipulação, ainda que bem-intencionada, para interferir no que erroneamente entendeu como sendo da sua conta. Essa é uma confusão que muitos fazem, e que gera todo tipo de equívoco, ego inflacionado, e credibilidades dizimadas tanto para os intérpretes, quanto para o oráculo em si. Foram inúmeras as vezes em que presumi, ao conhecer a história das pessoas durante uma sessão, que o melhor caminho era a direção “A” numa situação e as cartas apontaram para a direção “W”, e foi o melhor! Entendo que essa postura guarda em si o desejo íntimo de ajudar, e o medo de orientar erroneamente aquele que veio buscar sua ajuda. O erro, entretanto, está justamente em se esquivar da orientação transpessoal do símbolo para dirigir-se à finitude da sua opinião sobre temas que, na grande maioria das vezes, não domina. Sem dizer que opinião é algo que se pede a pessoas íntimas, de confiança, e que conhecem a trajetória de quem a solicita. Se pede a um tradutor que leia uma mensagem escrita num outro idioma que desconhece, e ele começa a selecionar ou trocar o sentido do que está escrito porque quer “ajudar”, ele não só estará mentindo, como manipulando e interferindo na comunicação. Seja o melhor e mais honesto tradutor que puder ser, sempre! Exatamente por isso que se desaconselha a leitura das cartas para pessoas muito próximas, ou com quem estejamos envolvidos pessoalmente.

Leituras oraculares são um caminho de
constante observação e aprimoramento.

Certa vez, há uns 20 anos atrás, atendi uma jovem beirando aos 30 anos e já no apogeu da sua carreira. Os arcanos revelavam sua intenção de fazer uma grande mudança, que envolvia carreira, casa e até troca de cidade ou estado. Muitas cartas de espadas, no entanto, mostravam uma intensa e tensa discussão mental sobre se aquilo era viável, ou uma loucura sem fim! Ela então disse que era justamente isso o que estava acontecendo, e era o que a trouxe até mim. Contou que fez uma viagem para Alto Paraíso, em Goiás, e que lá conheceu uma comunidade de Calendário Maia, que era objeto de seu estudo há algum tempo. Dito isto revelou que estava sentindo imensa vontade de largar tudo e se mudar para lá! Era uma jovem publicitária trabalhando numa das maiores agências do estado na ocasião, tinha contas interessantes sobre sua responsabilidade, o seu apartamento, seu carro, e tudo parecia estar indo na direção certa, mas essa vontade despontou avassaladora. Como sou humano fiz meus julgamentos, era jovem, estava deslumbrada com o que havia recém descoberto, e seria tolice se jogar nisso. Felizmente lembrei a tempo de que não veio pedir minha opinião, mas minha análise como um intérprete dos símbolos do tarot. E ele foi categórico em afirmar que aquele era o seu caminho, e que nunca mais voltaria atrás depois de partir. Com o coração na mão comuniquei isso a ela. Cerca de seis anos depois as pessoas que a haviam indicado me avisaram que “aquela amiga” estava na cidade fazendo a interpretação da Onda Encantada para quem quisesse. Depois de seis anos, e um único encontro, é claro que não lembrava mais dela, e muito menos sua história. Agendei um horário e fui para minha sessão. Chegando lá fui recebido com um grande abraço, um daqueles que se dá em amigos de longa data sem se encontrar. Fiquei meio sem jeito, mas retribui afetivamente. Ela, notando que eu não a reconheci, começou a me falar de suas lembranças, o que me fez recordar de toda nossa sessão! Disse também que pensava em mim com frequência, pois não tinha absolutamente nenhuma intenção de sair de lá. Mesmo quando conheceu e se apaixonou por um rapaz do interior de São Paulo que a convidou para se mudar com ele, o que ela rejeitou! Ainda que passado todo aquele tempo senti aquela maravilhosa sensação de missão cumprida, fiz bem em ficar estritamente no meu lugar de intérprete e canal da sabedoria profunda e ancestral dos arcanos.

Nuances Simbólico-Intuitivas

Voltando para a leitura de Pattie McLaine, um dos moderadores do grupo Tarot History, Tero Goldenhill, mencionou o fato de arcanos como o 9 de espadasA Lua, ou de A Morte não surgirem para esse tipo de revelação, e de nem sempre isso ser necessário, e eu concordo. Ele acrescenta à sua narrativa o fato de que uma ideia recorrente por lá nos anos 80 e 90 era de que o arcano de A Morte representaria uma mudança interna, enquanto que A Torre representaria então uma mudança externa. Aqui, no lado debaixo do Equador, nunca houve esse consenso. Entendem quando eu digo que o que molda as vivências com o tarot são nossas próprias perspectivas sobre o simbolismo dos arcanos? Goldenhill arremata sua observação dizendo que provavelmente Pattie usasse essa ideia já nos anos 60. É bem verdade, e já tratei deste tema no artigo Estados Alterados de Consciência no Tarot, que as cartas se sintonizam com nossa compreensão sobre elas, e começam a representar isso nas leituras que fazemos para nós mesmos e para os outros. Os grandes símbolos do inconsciente coletivo se moldam às nossas introvisões para que possamos entabular uma comunicação para nós mesmos, e para outros quando necessário. Então sim, o tarot é uma linguagem simbólica com uma estrutura própria e bem definida, porém a sua compreensão e aplicação é totalmente empírica.

Em janeiro deste ano fiz uma mandala astrológica para um cliente. Tenho usado as mandalas para obter uma perspectiva e prognósticos para o ciclo de um ano. Aconselho a abertura desta disposição no início do ano ou em ocasião do aniversário, que é o ciclo pessoal de desenvolvimento. Ao final da leitura tirei uma foto da mandala e o cliente perguntou se eu poderia mandar também uma síntese das casas por escrito, já que não havia gravado a sessão. Eu o fiz, um conjunto de frases breves que mandei pelo Whatsapp mesmo. Em meados de novembro ele me procurou dizendo que aconteceu o que eu havia previsto sobre a saúde da mãe dele. Como não fazia mais nem ideia do que havia dito fui procurar no histórico das nossas conversas, e eu havia escrito lá: “Foco na Família, apoio ou suporte para a figura materna, algum tipo de fragilidade física pedindo cuidados”. Ele me contou então que no começo do mês anterior, outubro, a mãe dele fez uma viagem ao exterior onde sofreu uma queda e fraturou de modo crítico o fêmur. Com mais de 80 anos, e com um acidente desta magnitude, sua recuperação estava sendo, além de sofrida, lenta! Fui verificar os arcanos que revelaram este prognóstico e estavam lá na casa quatro do signo de Câncer, representando as origens, a ancestralidade, os pais e a família o arcano de O Sol acompanhado da Rainha de copas. Já devem ter notado que as cartas mais desafiadoras, e que poderiam assinalar fragilidade ou perigo, como O EnforcadoA Torre, o 10 de paus, ou o 9 de espadas não estavam lá! Na minha jornada com o tarot O Sol dentro da mandala representa tanto o foco da consciência naquele ciclo anual, quanto a saúde e a disposição física, além de amor, êxito e alegria, tudo dependendo da casa que ocupe na leitura. A Rainha de copas, assim como todas as rainhas, pode se referir à uma figura materna. Especialmente delicada, sensível, servil e frágil conforme cada caso, tanto quanto uma mulher sedutora, misteriosa ou mediúnica com acentuados poderes de intuição, vidência e cura, conforme aparece na disposição.

Para os que observam estes mistérios que a prática com as cartas traz, fica claro o quão profundo e misterioso é este processo. E o quanto há aspectos totalmente fora, ou além, do controle e compreensão do próprio leitor. Os modos como os temas ou revelações se apresentam parecem ser graduados conforme a própria capacidade do consulente de absorver e lidar com os temas levantados. Mesmo que ainda haja aqueles que relutem ou neguem num primeiro momento.

Com este último relato quero explicitar ainda mais o quanto as leituras de tarot envolvem processos muito interiores e empíricos que precisam ser observados, tanto quanto os arcanos precisam ser estudados com disciplina em sua estrutura simbólica, para que sua linguagem não fique restrita a um conjunto excessivamente personalizado de impressões e percepções que podem então se tornar instáveis. Enfim, é aquela regra de ouro que diz que leituras eficientes são aquelas que unem racionalidade e disciplina a uma intuição acurada.

Sharon Tate (1943/1969), fim brutal de
uma carreira promissora

A Leitura de Pattie

Em outra sequência do documentário Patricia McLaine aparece fazendo uma outra interpretação aleatória de uma Cruz Celta, e sua explanação deixa claro que ela se utiliza da abordagem tradicional deste método de leitura. Não pretendo fazer uma avaliação completa desta tiragem histórica, pois afinal, teve a ver com aquele momento e com aquela pessoa que estava sendo atendida. Do mesmo modo que os arcanos de O Sol e da Rainha de copas não representariam para outra pessoa o que eu vi para aquele meu cliente. Há um contexto de leitura, outros arcanos e casas relacionadas com outros arcanos envolvidos. Além disso, como ocorreu no caso da leitura de Pattie, tudo o que se sente é o que nos é inspirado naquele momento, e nada mais pode ser acrescido a ele. Enfim, cada leitura é única!

Quero apenas comentar o que a mim fez imenso sentido, a começar pela Rainha de ouros, uma mulher linda e sedutora, como também rica, abrindo a leitura. Ela está cruzada pelo 3 de espadas que normalmente representa dor, conflito e sofrimento íntimo dentro de uma perspectiva psicológica, por um lado, como também o enfrentamento de um destino inescapável, pesado e cheio de apreensão por outro. A sequência de O Diabo (magia negra/satanismo), O Hierofante invertido (ritos pervertidos), e A Torre (desastre) mostram bem o que se deu...  O final não poderia ser mais aterrador, o 8 de espadas fala de um tormento prolongado, na maioria das vezes apenas moral e mental, mas Pattie com certeza percebeu nisso um prolongado tormento físico, como de fato foi o que aconteceu.

Leia também:

Que Tipo de Tarólogo Você É?  &

Estados Alterados de Consciência no Tarot    

*Patricia McLaine nos deixou em 2017. 


quarta-feira, 12 de novembro de 2025

Sincronicidade é Magia!

O Ás de paus, da versão clássica às releituras modernas
do Thoth e Rider-Waite tarot.

Foi Deepak Chopra quem disse que Sincronicidade é quando Deus decide ficar anônimo, e eu concordo! Trabalhar com a linguagem dos símbolos é testemunhar isso todos os dias, e ser testado na sua confiança na orientação interior. Recentemente dois clientes, um após o outro na agenda, tiraram o 9 de espadas na carta inicial da leitura. E, de fato, os dois estavam passando por um angustiante sentimento de restrição, sufocamento e não conexão! Ele, entretanto, tinha na sequência o 2 de copas. Esse sentimento se referia a um não pertencimento que se estendia desde a relação familiar à dificuldade que teve, desde sempre, em fazer amigos e se relacionar afetivamente. Ela tinha depois do 9 de espadas o 5 de paus, e toda sua angústia estava focada nas suas frustrações profissionais, onde todos os seus esforços pareciam infrutíferos!

Ler o tarot é cavalgar um corcel bravio... Tem de se aguçar todos os instintos, e também a atenção!

O 9 de espadas do After Tarot, de
Giulia Massaglia e Pietro Alligo.

Pois bem, eis que esta semana outro sincronismo espantoso aconteceu! Duas clientes, uma atrás da outra, tiraram o Ás de paus no fechamento das suas leituras. Com a mesma mensagem, que era: não empenhe tanta energia nos projetos e eventos futuros, pois vai precisar dela! A primeira tinha mesmo o 9 de paus na abertura inicial, que indicava a exaustão das suas forças, ao mesmo tempo que precisava seguir adiante para tocar sua vida e entrar numa nova fase (um novo empreendimento). A segunda tinha na abertura inicial um Valete de paus, indicando um entusiasmo com novos projetos. Uma exausta a outra empolgada, as duas com o naipe de paus (fogo/energia/vitalidade) abrindo suas sequências, mas ambas mulheres maduras que precisavam se preservar...

Trinta e sete anos depois a linguagem do tarot ainda me surpreende, e fascina!

*Texto publicado no Facebook em 15 de outubro de 2025.


sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Entre O Enforcado e O Mundo

O Enforcado e O Mundo, as duas faces de uma
mesma moeda. Imagem do Rider-Waite tarot.

Os alunos me perguntam com frequência sobre a relação do décimo segundo arcano, O Enforcado, e o vigésimo primeiro, O Mundo. Geralmente esse pedido de análise se dá em função de algumas similaridades curiosas em suas simbologias. Os dois arcanos possuem um cruzamento de pernas muito semelhantes, e ambos possuem de forma inversa a representação dos números 1 e 2. O cruzamento de pernas aparece primeiro na sequência dos arcanos maiores em O Imperador. Lá ele mostra um soberano empoderado em seu trono, senhor do mundo manifesto e de sua criação, ele está muito à vontade em sua posição. O Enforcado por sua vez não desfruta de tal conforto. Ele não mais se encaixa no mundo manifesto e, pelo contrário, oferece uma outra perspectiva que nasce desse profundo desconforto. 

O Enforcado, renúncia ou desilusão.
Imagem do tarot de Marselha.

De certa forma ele trai a sua própria natureza, e a natureza das coisas com as quais esteve envolvido, ao não mais se encaixar nelas. *Na Itália o homem pendurado era o símbolo de um traidor expatriado cuja imagem era desenhada e exposta pelas ruas das cidades. Muitas vezes a traição era uma discordância das autoridades (um dos atributos do Imperador) ou política vigentes. A nova perspectiva nasce de um desconforto, e gera outro maior. A inadequação é um fardo pesado, pois a diferença dói e a dificuldade de comunicação a partir desta diferença é enorme. É humano a resistência em entender o que é diferente do usual ou conhecido. No Rider-Waite o arcano de O Enforcado aparece com uma aureola dourada na cabeça, nos lembrando que os ditos iluminados também foram reconhecidos como estranhos, incompreensíveis e, na sua maioria, hostilizados ou martirizados. Na cabala o nome usado para eles é “os deuses sacrificados”, e se encontram na sephira de Tiphareth.

O Imperador, senhor absoluto do mundo
manifesto! Imagem do Thoth tarot.

Sendo assim a sua nova visão surge de um profundo desapontamento. Na imagem clássica seus bolsos estão abertos sugerindo que o que ele carregava se perdeu, sem com que houvesse nada que ele pudesse fazer! Suas mãos estão para trás, o que tanto pode indicar essa impotência quanto uma renúncia em seguir com determinado comportamento ou status. Na vida comum O Enforcado aparece como um súbito despertar para o imponderável, onde reconhecemos que nada podemos diante de uma determinada situação ou que não cabemos mais nela. Podemos nos sentir excluídos, perdidos e sem direção numa estagnação profunda e sufocante, ou decidir conscientemente entregar o que pensávamos ser nosso lugar, ou direito, à espera de um novo sentido ou direção! O sofrimento será proporcional à nossa capacidade de entender e ressignificar o momento. Sua correspondência astrológica com Netuno é mais do que adequada, este é o planeta que dissolve as formas enrijecidas da percepção, afrouxa as fronteiras entre o concreto e o imaginário, e turva o que chamamos de real para ampliar o seu escopo de possibilidades. Tudo isso, porém, costuma gerar imenso sentimento de confusão e desconexão dentro das qualidades e vivências representadas pela casa astrológica que Netuno ocupa no mapa natal. A sua numeração, 12, seria a representação da consciência (1) sendo dividida, ou exposta ao seu oposto para revelar outra realidade (2). Como o zodíaco representaria com seus doze signos o campo total da jornada evolutiva da humanidade, ampliando o próprio sentido de existir. O mesmo acontece com o mito dos doze trabalhos de Hércules, onde o herói é transformado ao longo da sua trajetória, claro que não sem muito sofrimento no percurso em que ele se eleva da condição humana para se tornar um dos deuses do Olimpo. Sendo assim, o que chamamos de sofrimento seria uma proposta evolutiva para a consciência, e a compreensão da vida e de si mesmo.

O Mundo, amadurecimento e conclusão.
Imagem do tarot de Marselha.

No arcano de O Mundo o cruzamento de pernas representa a retomada da própria autonomia, e a superação das vivências dolorosas de O Enforcado. A estagnação foi transformada num passo de libertação. Os ciclos de sofrimento e inversão de perspectiva, que antes causavam desconforto e sentimentos como inadequação e não pertencimento, agora são transformados em finalização de ciclos, amadurecimento, realização e de encontro do seu lugar no mundo!  A sua correspondência astrológica com o planeta Saturno é igualmente perfeita. Saturno é o planeta da maturidade, sobriedade, sabedoria e, sobretudo, de aprendizado e crescimento com as experiências vividas ao longo do tempo, sem as quais não se adquire nenhuma das qualidades antes citadas. Enquanto Netuno dilui e confunde, ao mesmo tempo em que revela outras verdades e perspectivas, Saturno define, delimita e separa o velho e o novo. Antes da descoberta de Urano, em 1781, este era o planeta regente tanto de Capricórnio, a tradição, quanto de Aquário, a renovação. A dançarina sai da grande mandala cercada dos quatro elementos com os braços soltos e segurando nas mãos uma (ou duas, nos baralhos modernos) vara mágica. O instrumento mágico de O Mago ressurge em suas mãos. A impotência e a renúncia ficaram para trás, a imagem sugere centramento e harmonia, onde a síntese de tudo o que foi vivido alcança seu ápice, máxima realização, excelência! A numeração sugere que a dualidade e a via interior (2) encontram uma síntese, e uma expressão para o mundo (1). O pai divino (1) e a mãe divina (2) finalmente se reencontram – são eles que aparecem nas figuras de O Mago e de A Sacerdotisa no começo da jornada arquetípica dos 22 trunfos. Os sentidos estão todos unificados e o propósito realizado. O final da jornada sugere, porém, outro início. A saída da mandala sugere uma nova jornada num outro nível, mais sublime, e a partir de uma perspectiva mais elevada. De novo a perfeita analogia com Saturno se revela, ele é o senhor da velhice sábia como o resultado de uma vida plenamente vivida. É nesse momento que o arcano de O Louco, que surgiu no começo da sequência dos arcanos maiores como um ignorante em busca da verdade, reaparece como o Louco divino. Aquele que não se encaixa no mundo e não sofre por isso, pois conhece seu propósito e direção interiores, e agora sai pelo mundo a disseminar sua nova visão.

*Leia A História do Enforcado 


sexta-feira, 26 de setembro de 2025

Construindo o Arcano Interior

O arcano interior é um trabalho de estímulo à criatividade pessoal e um maravilhoso método de reflexão. Não existe aqui, portanto, nenhuma intenção de incentivá-lo a criar o seu próprio baralho. O trabalho do arcano interior é um modo de ver como se está construindo a visão pessoal de um determinado arcano (no caso, aquele que nos guia), e exercitar não só o nosso potencial criativo, mas também estabelecer uma conexão pessoal com a linguagem do tarot, além de oportunizar um meio de reflexão apurada sobre as motivações pessoais mais recônditas no in consciente e que se projetam nas imagens escolhidas. O primeiro passo é, sem dúvida, o cálculo do seu arcano da alma.

A Justiça (Balanço), do Voyager Tarot,
um lindo baralho de colagem que
me inspirou a construção do arcano interior.

O sistema é bem divulgado na literatura popular sobre o tarot. É bem simples: some dia, mês e ano de nascimento. Se, por acaso, obter um resultado acima de 9 e até o número 22, não reduza. O número corresponde aos trunfos dos arcanos maiores e representa o arcano da personalidade. Ele indica, de modo bem generalizado, como se lida com o mundo externo e qual imagem, consciente ou inconsciente, passamos para o mundo exterior. 

Para descobrir o número do arcano da alma reduza o número composto a um único dígito. Veja o exemplo: 

05/ 09/ 1968 = 5 + 9 + 1 + 9 + 6 + 8 = 38 = 3 + 8 = 11 A Força, o arcano de personalidade desta pessoa é A força. Somando 1 + 1 = 2 A Sacerdotisa A carta de A Sacerdotisa é a carta da alma do exemplo acima. O arcano mostra a essência de tudo o que se vem buscando e desenvolvendo ao longo da sua trajetória e qual o melhor meio de se obter êxito ao abordar, sobretudo, os temas de relevância, como missão de vida espiritual, e dons pessoais. Como esta não é uma abordagem específica, e nem o pretende ser, é aconselhável que se medite sobre o significado mais profundo de cada arcano e o modo como ele opera em sua vida. 

Caso a soma da data de nascimento resulte em um número maior que 22 (neste caso, o arcano zero o louco, que é a vigésima segunda carta fica com valor numérico 22), a pessoa em questão terá o mesmo número de personalidade e de alma, o que só enfatiza as características do arcano em sua vida. Por exemplo: uma pessoa nascida a 14 de maio de 1970 terá, como resultado da soma da sua data de nascimento, o número 27, que não corresponde a nenhum dos arcanos maiores. Feita a redução, o resultado é 9, o número de O Eremita. Assim, a pessoa possui O Eremita como o arcano da personalidade tanto quanto arcano da alma. Para esses casos sugiro que se faça até duas versões do arcano interior. 

O lindo trabalho de fotomontagem, através
de colagens, realizado pelo artista visual
Ken Knutson para o Voyager tarot é surreal!

Construindo o quadro da alma 

Para iniciar o trabalho do arcano interior é preciso que se recolham algumas imagens ou fotografias, recortadas de revista. Podem ser coloridas e preto e branco. A mistura desses componentes cria uma impressão estética fantasmagórica que, a mim, agrada. Se não desejar, utilize apenas imagens coloridas. O fundamental é que não se faça nenhum tipo de julga mento quanto ao material que se está escolhendo. Use, como único critério, o seu senso estético e a impressão intuitiva que as imagens lhe causam. Depois de separadas as imagens que mais agradam, pro cure avaliar aquelas que se destacaram. O critério é a simples apreciação estética. Separe também as que mais causaram im pacto e as que pareceram estranhas. Agrupados os três conjuntos, inicie olhando fixamente para cada uma das figuras em seus respectivos grupos. Não tenha pressa na decisão. Use os olhos para fazer a seleção. Eles serão os seus juízes. Deixe a mente fora disso, o máximo que puder. 

➧ Quando chegar à seleção final, comece acoplando as imagens numa folha de papel sulfite comum. Não se preocupe com a coerência ou ordenação das fotos. Não esqueça nunca de que o gosto pessoal é o único critério. Também não deixe que o pensamento condicionado pelo medo da opinião alheia freie o processo criativo. O trabalho é só seu e somente será mostrado aos outros se quiser. Como uma criança, tenha sempre em mente de que o que se está fazendo é nada mais do que uma coleção de coisas bonitas exclusivamente para o seu próprio prazer. 

➧ Na hora da colagem respeite somente duas regras: 1) Escolher uma imagem para ocupar a parte central da folha. A imagem deve representar a qualidade mais significativa que você vê no seu arcano da alma. 2) Não deixar nenhuma parte da folha branca aparecendo. Cubra todos os espaços visíveis. Caso algumas pontas das fotografias escolhidas fiquem de fora, corte-as. Isso contribui para criar uma visão de quadro. Ao final, o efeito será surrealista ao mesmo tempo em que realista.

Trecho extraído do meu livro "Tarot para Autotransformação".

Para adquirir o livro clique aqui: Livro 

quinta-feira, 28 de agosto de 2025

Os Três Ciclos de Saturno

Saturno demora em média 29 anos para dar uma volta completa no zodíaco e voltar ao mesmo signo em que estava no momento do nascimento de alguém, e fica, em média, 2 anos e meio em cada signo. A este ciclo costumamos chamar “retorno de Saturno”. Erroneamente, porém, costumamos achar que existe apenas um, e que se dá por volta dos 30 anos. Este é, entretanto, um dos três ciclos que uma pessoa em média vive ao longo da vida. A cada um deles o Saturno natal, sempre dentro das qualidades que o signo em trânsito e a casa onde ele se encontra, irá requerer uma reflexão e subsequente posicionamento e ação. Ele chega por volta dos 29 anos e fica até os 30 anos e meio em seu primeiro retorno. Entre 58 e 59 anos e meio faz sua segunda visita e à casa natal, e entre 87 e 88 anos e meio realiza sua última visita para encerramento do ciclo encarnatório e evolutivo – Saturno rege tanto o Karma quanto tempo – ou para um ciclo de legado ou colheita kármica. Com o tempo percebi um padrão no comportamento daqueles que estão vivendo estes trânsitos. Lembrando que padrão não é regra, mas uma base de comparação formada por um consenso, neste caso de observação das vivências em diferentes faixas etárias e níveis sociais e intelectuais. Segue abaixo uma síntese dessas três voltas de Saturno e seus reflexos tanto no âmbito prático quanto psicológico do homem.

Representação medieval do planeta Saturno,
o Senhor do Tempo!

O Primeiro Retorno 

Entre 29 e 30 e meio anos de idade

Quando chega este primeiro retorno as bases intelectuais e morais de uma pessoa já estão formadas, e as perguntas que se fazem nesse período geralmente são: O que eu quero fazer da minha vida? O que aprendi e desenvolvi até aqui ainda me serve? Ou autodeclarações do tipo: Vou fazer isto! Esse trabalho é melhor para mim por causa disto. Vou seguir esta carreira porque no futuro eu quero fazer isto... É nesta fase que se encontra e se segue a missão de vida, a carreira escolhida ou que se troca de direção; se faz concursos, ou outras formações, se estabelece metas e prazos para realizar ou conquistar objetivos tanto profissionais quanto pessoais, acadêmicos, e mesmo filosófico/espirituais.

Por outro lado, pode ser também a fase em que se “perde o rumo”, onde pode acontecer um reconhecimento de que se está perdido ou não preparado para esta fase de definições maduras. Essa angústia poderá ser uma crise criativa que fará com que o indivíduo corra atrás desta percepção perdida ou não maturada. Ignorá-la, porém, poderá resultar num angustiante sentimento de desorientação, falta de propósito e pertencimento cuja intensidade será proporcional ao desejo de cada um por encontrar um caminho e definição interior. Saturno é o senhor das definições, ele trabalha os limites necessários para a formatação de todas as coisas, e é também o grande senhor do tempo. Muitas vezes durante esse primeiro trânsito poderemos nos sentir acometidos de uma sensação de que estamos perdendo tempo na vida! Quanto mais sintonizados com esta urgência tanto mais sintonizados com o poder construtivo saturnino. É claro que outros fatores relativos ao mapa, e às ações de cada um, indicarão se as ações tomadas resultarão em realizações bem-sucedidas. A falta de experiência para lidar com as transições de grande transformação, típicas desta fase da vida, colabora para que estas encruzilhadas internas se tornem ainda mais dramáticas!

A casa e o signo em que Saturno se encontra
no mapa natal definirão no seu retorno
as vivências de cada ciclo.

O Segundo Retorno 

Entre 58 e 59 e meio anos de idade

Esta é fase do olhar para trás, para tudo o que foi vivido e construído, de se pensar na possibilidade da aposentadoria, e se perguntar coisas como: O que eu quero para mim daqui por diante? Como quero viver esta etapa final da minha vida? Este é um momento em que nos sentimos mais dispostos a sonhar com outras possibilidades, como carreiras tardias, que geralmente estão relacionadas a sonhos não vividos ou simplesmente protelados. Muitas pessoas começam a fazer planos para mudar de casa, bairro, cidade ou até mesmo estado! Outros pretendem viajar mais ou viver no campo, alguns como apicultores, pequenos produtores rurais. Já vi pessoas fazendo planos de aposentaria para fazerem intercâmbios culturais com o intuito de aprenderem outros idiomas, ou virarem guias turísticos. Alguns se transformam em terapeutas complementares, e outros retornam à faculdade para fazer outra formação como psicologia ou pós-graduação em psicanálise; e há o nascer tardio de astrólogos, estilistas, empresários que investem em cafeterias, confeitarias... Enfim, esta é uma fase criativa e de exploração de possibilidades! Há pessoas que podem simplesmente não dar o passo rumo a uma nova realidade pelo simples fato de se sentirem ainda conectadas com o que fazem, e o seu propósito mais intrínseco. Podem apenas mudar o ritmo, a frequência ou o modo como vinham trilhando seu caminho e fazendo suas atividades.

Por outro lado, assim como acontece no primeiro ciclo saturnino, a proposta evolutiva pode não acontecer devido a uma identificação excessiva com a própria jornada e, por isso, uma total falta de perspectiva sobre o que há de vir se abre diante de si. Muitas carreiras requerem uma aposentadoria compulsória, e se internamente nenhum interesse ou plano foi ativado, o sentimento de vazio pode ser imenso! Ninguém é só uma coisa, e é sobre isso que fala o autoconhecimento. Conhecer todas as partes de si mesmo amplia nossas possibilidades de cocriação e renovação pessoal! Esse engessamento da consciência resulta, com frequência, em desânimo, apatia ou mesmo depressão. Todos muitos prejudiciais à manutenção da vida e do equilíbrio psíquico!

Os ciclos saturninos são propostas de
amadurecimento e evolução!

O Terceiro Retorno 

Entre 87 e 88 e meio anos de idade

Este é o grande tempo de encerramento de ciclo ou da colheita de tudo o que foi plantado! Nesta fase muitos encerram seus ciclos evolutivos. Saturno é o senhor do tempo, e também do propósito e missão de vida. Neste terceiro e último retorno muitas pessoas encerram sua jornada evolutiva, de modo fácil ou difícil de acordo com o Karma de cada um. Demências de todo tipo podem surgir, tumores, doenças crônicas ou o apogeu e o reconhecimento de um legado! Isso serve também para os que avançam essa fase de transição da última passagem de Saturno. Bons exemplos não faltam. Alejandro Jodorowsky, nascido em 17 de fevereiro de 1929, é um psicólogo, e também um consagrado poeta, roteirista, cineasta cult, e estudioso do tarot desde 1951. E apesar de sua extensa carreira com cursos, atendimentos, e conferências desenvolvendo o que ele chama hoje de o tarot genealógico, seu primeiro livro só foi lançado em 2016... Sim, exatamente durante o seu 87º aniversário, e terceiro ciclo saturnino. Seu legado para a tarologia é contemplado com a longevidade do Senhor do tempo. Hoje aos 96 anos Alejandro tem vida, fôlego e lucidez para continuar divulgando seu trabalho e disseminando sua visão! O que nos leva à questão: o que, afinal. Saturno quer de nós?

A Proposta de Saturno

Saturno, ou melhor dizendo a força psíquica que ele representa, impulsiona cada ser humano sobre a terra a contribuir com a evolução da própria vida. Os inúmeros papéis que assumimos no mundo alimentam os múltiplos interesses das mais variadas pessoas da comunidade humana, a fim de que nossa sociedade evolua nos muitos níveis em que se encontra cada ser humano em sua jornada evolutiva, contribuindo assim com o enriquecimento e manutenção da vida! Precisamos de médicos, advogados, dentistas, economistas, e programadores tanto quanto de padeiros, artistas poetas, contadores de histórias, tarólogos, astrólogos, curadores e ambientalistas porque a vida é múltipla, e avança em sua diversidade com bilhões de vidas atuando em diferentes setores. Saturno rege a missão de vida, ou seja, nos convoca a encontrar e desenvolver um propósito dentro desta diversidade colossal, e cheia de possibilidades e oportunidades.

Na antiga Roma eram celebradas as Saturnálias, festas agrícolas ao deus Saturno, deus das sementes. O festival era celebrado próximo ao solstício de inverno, com o fim das colheitas, e os ritos eram uma oferenda ao deus para que protegesse a terra e os homens que dependiam dela num novo ciclo de fertilidade e prosperidade! O mito vive em nós que ao final de cada ciclo de 12 meses fazemos votos, e novos projetos para a renovação de nossa permanência no mundo, e com nossos planos a continuação de tudo e todos que vivem num mesmo tempo e campo de influência que nós! As bênçãos de Saturno são a longevidade, a produtividade e proeminência. Hoje a medicina comprova que o ócio adoece e o trabalho prolonga a vida, a saúde e a lucidez!

Saturno reflete como podemos tornar
nosso tempo na Terra útil! 

A vida, e seu propósito tanto individual quanto coletivo, são um mistério que nasce com a percepção de que existimos. Disciplinas como a astrologia procuram elucidar dentro da perspectiva simbólica este enigma, e assim conseguimos observar padrões relacionados entre os ciclos do mundo e os movimentos celestes. Porém, como disse antes, um padrão não é uma regra, e não teria como ser. O tempo de duração de uma vida, e a extensão do seu legado, são um mistério muitas vezes impossível de se prever. 

Outro bom exemplo disso é o do mestre em balé, coreógrafo, e professor de dança Bernhard Wosien (1908/1986). Por toda sua vida estudou os aspectos da dança dentro de uma perspectiva tanto espiritual quanto terapêutica. Em 1976, por volta dos seus 68 anos, introduz as Danças Circulares Sagradas na fundação Findorn, na Escócia. Este foi seu grande legado artístico e espiritual para a humanidade! Por uma década inteira divulga seu trabalho pelo mundo, até nos deixar em 1986. Reparem que isto tudo se deu depois do seu segundo retorno de Saturno, e sua partida antes do terceiro retorno. Isso confirma o que disse antes, cada um tem seu próprio tempo de crescimento e desenvolvimento na Terra. Assim os ciclos astrológicos são uma indicação, mas nunca uma determinação!

O Tempo de Saturno

Por fim, acho importante discutir sobre o tempo de duração de um trânsito saturnino. Dois anos e meio corresponde ao seu ciclo astronômico, porém seus efeitos podem sim, e tenho observado isso cada vez mais nas pessoas que atendo, se estender até um ano além do usual. Assim muitas pessoas o sentem até os 31 anos no primeiro ciclo, até os 60 no segundo e até os 89 no terceiro. Caso também o seu apelo por estruturação, reforma e execução não seja atendido durante sua passagem, as reflexões, dilemas e busca por resolução ficam ecoando por alguns anos à frente. Muitos astrólogos insistem que a astrologia é um estudo mito-simbólico que se utiliza da precisão dos movimentos celestes para sua execução, e é verdade. Por outro lado, os planetas e signos, são expressões simbólicas da estrutura psíquica do ser humano, e o tempo exato de duração ou intensidade vivida entre o sincronismo celeste e as manifestações da alma são, desculpem me repetir, difíceis de prever ou calcular.


quinta-feira, 3 de julho de 2025

Entre A Temperança e A Estrela

As semelhanças e diferenças...

Vasculhando as redes sociais me deparei com a observação de uma renomada figura no estudo da tarologia, onde ela menciona que em sua experiência muitos novatos no caminho do tarot costumam ficar confusos sobre o simbolismo de A Temperança e de A Estrela como aparecem no Rider-Waite. Achei a confusão mais que primária e injustificada, a mim a diferença entre os dois arcanos é bem evidente! Porém, penso que a insistência dos tarólogos norte-americanos em tomar o Rider-Waite como toda a verdade sobre o tarot, mesmo muitos reconhecendo suas inúmeras intervenções e distorções, e outros negando ou ignorando suas origens medievais e europeias, abre espaço para esse tipo de confusão! Somando-se a isso também a relutância de muitos em ver os arcanos do tarot como uma jornada evolutiva da alma, onde um arcano deriva do outro como numa oitava superior no crescimento do Si-mesmo também abre brecha para esse tipo de coisa. Abaixo faço uma breve apresentação sobre o simbolismo desses dois arcanos em suas semelhanças e diferenças:

A Temperança

Em A Temperança, a figura angélica se ergue depois que o arcano anterior, A Morte, se abre sobre o mundo. Existe neste arcano um apelo para se voltar à vida ressignificando-a, ou extraindo do esvaziamento do arcano anterior um novo ou real sentido para se viver! Daí sua correspondência astrológica com o signo de Sagitário ser tão significativa, a alquimia entre o animal e o arqueiro que almeja as alturas do desenvolvimento e do crescimento em todos os níveis está perfeitamente representada na união dos vasos, onde os líquidos fluem de um para o outro, misturando-se e alquimizando-se. Em algumas versões clássicas eles aparecem nas cores vermelho e azul, ou prata e dourado, simbolizando corpo e espírito. As partes extraviadas da psique são reunidas com o propósito de elevar a própria consciência, assim como o elemento fogo está indo sempre em direção ao mais alto, como seu símbolo alquímico estampado no peito do anjo. Esta integração também é representada nos pés da figura, onde cada um repousa tanto na terra quanto na água, de novo representantes do corpo e do espírito unificados neste sentido! Ao lado uma flor de Íris cresce, símbolo da criatividade inspirada, e ao fundo um halo de luz paira sobre as montanhas, novamente evocando a ideia de elevação, expansão e iluminação! Enfim, neste arcano fica claro que uma consciência desponta revitalizada, centrada, integrada e focada num objetivo, meta ou ideal que cria um movimento de crescimento, expansão e evolução em todos os âmbitos possíveis ou imagináveis a serem analisados conforme a leitura! E sempre dirigidos à vida e suas manifestações, como bem mostra o símbolo solar – criação, vitalidade, foco, despertar, iluminação – que a figura traz em sua testa.

A Estrela

No arcano de A Estrela a realidade é outra. A donzela é antecedida pelo arcano de A Torre, uma estrutura que foi destruída, mas não de todo devastada. A imagem é mais de libertação do que de integração e direcionamento. Ao contrário da figura angélica de A Temperança a donzela de A Estrela está de joelhos – símbolo de humildade, e submissão – e não de pé – símbolo de autonomia, e prontidão para agir. Os pés também tocam a água e a terra, o que revela conexão física e emocional/espiritual, porém os seus jarros são esparramados na terra e na água simbolizando fluidez, e entrega. A vontade está aberta e receptiva e não direcionada a algo ou alguma coisa. Está cercada de estrelas, indicando essa abertura a um plano mais abarcante da existência. Note que o anjo de A Temperança parece absorto no ato de misturar as águas de seus jarros, enquanto que em A Estrela a donzela parece estar em êxtase, ou numa espécie de transe. Tudo fala de despojamento, ela está nua, outro símbolo de vulnerabilidade e entrega. Estava presa no arcano anterior, e agora livre experimenta uma conexão com o todo. Há um claro clima de pertencimento, e ampliação da consciência. Como que percebendo de súbito que faz parte de um contexto maior, e se abrindo completamente a esta nova perspectiva. O signo de Aquário, o aguadeiro do zodíaco, representa muito bem este arcano, regente da liberdade e convivência social. Assim como *Hércules – figura mitológica relacionada a este signo – que desviou o curso dos rios Alfeu e Peneu para limpar os estábulos imundos do rei Augias, sem com isso buscar vantagem alguma, apenas a recuperação de sua dignidade humana ao expiar um crime cometido no passado. Aquário é o signo daqueles que estão a serviço da comunidade humana de algum modo, e com isso sempre renovando o que nos tornou uma espécie bem-sucedida por ser coletiva, inter-relacionada e disposta a se apoiar mutuamente. A Estrela traz a marca da coletividade, da solidariedade, da interatividade, e da comunhão com o todo, apesar de todas as nossas diferenças.

A Temperança – Fala de vontade harmonizada e integrada, com direção, propósito e movimento trabalhados de forma contínua e persistente para se atingir algo, seja interno ou externo.

A Estrela –  Fala de uma abertura de consciência disposta a novas relações e interações, conectando-se às muitas possibilidades inovadoras de se viver, criar e conviver pelo bem do todo.

Enfim, as metas e ou ideais forjados em A Temperança são ampliados à luz de uma nova perspectiva em A Estrela. Um trabalho árduo e contínuo – A Temperança – encontra um súbito despertar, e um relaxamento de qualquer vontade direcionada para simplesmente tornar-se receptivo – A Estrela.

*Os Trabalhos de Hércules, de Alice A. Bailey. Editora Lucis, 1991.


quinta-feira, 29 de maio de 2025

As Combinações Mágicas do Tarot

O mundo mágico se divide, basicamente, em dois tipos de personagens: os magos e os médiuns/sensitivos. Mago, termo oriundo da antiga religião persa do zoroastrismo, simboliza um sacerdote com poderes de manipulação dos elementos e da capacidade de utilizar dessas forças para o crescimento tanto pessoal quanto humano em escalas bem maiores. O Mago é aquele que faz as coisas se manifestarem, e acontecerem.  O mago é, por definição, alguém que faz as coisas se moverem. Os médiuns/sensitivos recebem inúmeros nomes desde estes que citei até intuitivos, clarividentes, clariaudientes, sencientes, etc. Todos eles estão bem representados no arcano de A Sacerdotisa e, ao contrário dos Magos, eles não manipulam ou forçam as forças do invisível a se manifestar, mas sim permitem que elas atuem sobre si, comungando com sua força e clareza a serviço da vida! A força dos Magos é masculina/yang, mais comum no gênero masculino, mas presente também em muitas mulheres. As yalorixás do candomblé, por exemplo, possuem esse poder de manifestação. Da mesma forma a força dos médiuns/sensitivos é feminina/yn, porém todos os sacerdotes de Amon, o oráculo mais antigo e de mais longa duração da história, era composto por meninos notáveis que aos cinco anos faziam seus votos para se tornarem os oráculos vivos do grande deus Sol. Até Alexandre o Grande se consultou com eles!

Dito isto apresento aqui as combinações mágicas que percebo neste casal mágico, O Mago e A Sacerdotisa, entrelaçando seus significados com o significado de outros arcanos místicos, ou espirituais. Este é apenas um exercício para expandir as possibilidades de desdobramento simbólico do tarot. Quem conhece meu trabalho sabe que não atuo com os arcanos com este enfoque mágico ou oculto, mas como sempre digo, repetidas vezes, é ótimo saber que o tarot pode efetuar essas revelações.

As Combinações de O Mago:

Mago + Hierofante (O curador e terapeuta) – O Mago curador, o conhecedor de todas as chaves de cura, desde ervas, pedras elixires, fórmulas, à Luz universal (chi, ki, prana, etc) transmitida através das mãos ou de mentalizações. Que se utiliza do poder dos mantras que curam, e das palavras de poder, para transformar a realidade.

Mago + Eremita (O sábio solitário) – O mago solitário, aquele que busca o conhecimento da magia sem conexões com grupo ou ordens, o bruxo solitário. Um caminho severo em que muitos equívocos podem ocorrer, mas onde se cresce com os erros.

Mago + Morte (O mundo dos mortos) – Necromante, o invocador dos mortos para oráculo ou magias de cura ou mesmo de vingança ou morte, e também que usa os mortos como mensageiros.

Mago + Temperança (Os mensageiros do mundo superior) – Aquele que domina a magia angélica, utilizando a força superior dos anjos para curas, purificação e elevação dos níveis de consciência e do conhecimento do porvir.

Mago + Diabo (O senhor das trevas da alma) – Mago negro, conhecedor de todas as magias das trevas de domínio, subjugação e malefícios; se estiver usando para o bem conhece bem as artes das trevas para autodefesa e defesa dos que querem bem!

Mago + Estrela (O mundo natural) – Este é o Mago que evoca as forças elementais com destreza, conhecedor dos reinos naturais e dos seus segredos de força e preservação. Pode ser também o xamã.

Mago + Lua (A senhora da noite e dos espíritos) – O invocador dos espíritos de poder, conhecedor de todas as entidades e deidades ancestrais e que pode invocá-los quando preciso.

As Combinações de A Sacerdotisa:

Sacerdotisa + Mago (Senhor da palavra e da inteligência) – O grande sensitivo/intuitivo, aquele que sabe e reconhece a verdade apenas abrindo o canal interior; o que ouve a voz silenciosa, aquela que revela as verdades ocultas com precisão e profundidade. Aquele que tem acesso aos planos superiores da consciência e do saber  

Sacerdotisa + Hierofante (O curador e terapeuta) -  O médium curador, aquele que capta as enfermidades, e até mesmo muito antes de sua manifestação. Podendo agir como um curador sem métodos ou técnicas específicas.

Sacerdotisa + Morte (O mundo dos mortos) – O médium que se comunica com os mortos, um intermediador entre o mundo dos vivos e o dos mortos.

Sacerdotisa + Temperança (Os mensageiros do mundo superior) – O que canaliza ou percebe o mundo angélico entre as coisas da Terra.

Sacerdotisa + Diabo (O senhor das trevas da alma) – Os médiuns que percebem ou interagem com o mundo demoníaco.

Sacerdotisa + Estrela (O mundo natural) – O canalizador do mundo natural, e dos seres da natureza. Aquele que dá voz aos reinos elementais, mas também às outras dimensões e planos galácticos da existência. É também o sensitivo que vê a aura das pessoas, e como elas expressam suas emoções e saúde.

Sacerdotisa + Lua (A senhora da noite e dos espíritos) – Os médiuns e sensitivos que se conectam e se comunicam com uma enorme gama de seres espirituais em diferentes planos da existência.

Sacerdotisa + Mundo (A totalidade da vida) – Os grandes clarividentes, aqueles cujas visões ultrapassam o tempo e o espaço, e que descrevem com precisão fatos e pessoas do agora e do porvir.