quarta-feira, 16 de maio de 2018

A Viagem da Alma nos Arcanos Menores...

Foi Arthur Edward Waite que ao lançar em 1910 o seu Rider-Waite, quem insinuou nas imagens desenhadas por Pamela Colman Smith sob sua orientação, que havia um caminho evolutivo dentro dos arcanos numerados de 1 a 10 de cada naipe. Não há como saber se isso foi consciente ou não, mas com certeza foi uma contribuição de imensa importância para o estudo, o desenvolvimento e a compreensão da tarologia como um todo. Igualmente importante, embora menos valorizada, foi a contribuição da parceria entre a taróloga Juliet Sharman-Burke e a astróloga Liz Greene. Setenta e seis anos após o lançamento do tarot Rider elas "explicitaram", por assim dizer, a existência de uma clara sequência evolutiva ao criar uma correspondência mitológica entre cada um dos quatro naipes do tarot com a viagem mítica de diferentes heróis gregos em seu Tarot Mitológico de 1986, com imagens de Tricia Newell.

A Viagem de O Louco continua nas cartas numeradas
dos arcanos menores (O Louco - Dioniso - do Tarot Mitológico).

Assim como nos arcanos maiores, onde revela-se claramente uma viagem evolutiva da consciência ao percorrer os 22 trunfos, que representam as experiências arquetípicas fundamentais da alma, também nas cartas numeradas dos quatro naipes ocorre uma jornada evolutiva dentro do escopo de experiências delimitadas por suas atribuições no mundo prático, em sua busca por manifestação na sequência de 1 a 10
Sendo 1 a vibração mais livre e expansiva e 10 a mais densa e condensada, veremos que os naipes de elementos yang ou masculinos, paus/fogo e espadas/ar, terminam suas jornadas de forma mais dramática, pois que suas naturezas voláteis requerem uma dinâmica e renovação constantes. Já os naipes que correspondem a elementos yn ou femininos, copas/água e ouros/terra, encerram suas trajetórias harmoniosamente, pois que suas naturezas mais plásticas e densas se coadunam melhor com o processo de manifestação, realização e estabilização.
Em paus vemos a força da ação criativa. Em copas a vivência dos sentimentos e da espiritualidade humana. Em espadas a busca pela verdade, e o confronto com inúmeros contraditórios nessa busca. Em ouros vemos o envolvimento com o mundo físico e dos sentidos, e o desenvolvimento dentro daquilo que conhecemos como a realidade!

Naipe de Paus


O Às de paus (A Fonte),
do Osho Zen tarot.
O baralho que, na minha opinião, melhor expressa as qualidades criativas e lúdicas do naipe de paus, regido pelo fogo, é o Tarot Zen de Ma Deva Padma. Inclusive nesse baralho o naipe de paus se chama “Fogo”.
A expressão do mundo criativo irrompe furiosamente no Às de paus, lançando luz, força e energia para todos os lados. Renovando, iluminando e revitalizando tudo! A partir do 2 de paus essa energia saturada de si mesma, procura uma atuação mais específica onde possa descarregar sua força acumulada. No 3 de paus essa força, plena e confiante de si mesma, começa a fazer experimentos testando a si e seus limites. No 4 de paus a energia criativa busca apoio e complementação para que possa se expressar harmoniosamente, mas acaba encontrando as frustrações naturais de todo processo criativo no 5 de paus, o que pode bloquear o processo, embora na maioria das vezes só o que faz é atrasar um pouco. 
No 6 de paus a vitória se dá, a força criativa atinge seu ápice, e o reconhecimento inevitável por todo o empenho realizado vem intensa e naturalmente... Um momento de puro regozijo! Mas a força dinâmica do fogo não para! Sua atuação segue adiante e no 7 de paus há o apelo para superar os próprios feitos, investir com toda a força, e nessa postura logo se chega aos limites de suas próprias forças, causando estresse e gerando um energia bruta que todos percebem, mas que poucos apreciam! De repente no 8 de paus o mecanismo criativo ilumina a si mesmo, e o que vemos é um súbito esclarecimento que faz sumir toda a tensão, traz um reconhecimento interno do extremo da própria situação mudando perspectivas ou a realidade externa, ou a ambos. 
Chegamos então ao 9 de paus, ou seja, uma completa exaustão das forças vitais, uma percepção de “eu não aguento mais”, embora ao redor tudo continue exigindo o emprego de grandes quantidades de energia... No 10 de paus não há mais possibilidades de se seguir adiante, a força criativa extingue a si mesma, pois como no movimento de A Roda da Fortuna, a roda do tempo girou e a contribuição de cada um foi dada, agora abre-se espaço para que outras formas de expressão e criação se manifestem e sigam o mesmo itinerário que se seguiu, retornando a força pujante e renovadora do Às de paus.

Naipe de Copas

O 3 de copas, do Rider-Waite.
Aqui eu percebo que a natureza emocional do naipe de copas foi bem captada pelo Rider-Waite Tarot, já a natureza mística desse naipe regido pela água, foi mais bem captada tanto pelo Tarot Zen quanto pelo Motherpeace Tarot.
No naipe de copas a força do sentimento mais profundo se esparrama sobre toda a criação, no Às de copas um místico sentimento de comunhão com toda a humanidade, a vida, os seres vivos, ou o propósito de uma atividade se dá (o encontro da vocação da alma), sem nenhuma necessidade de reconhecimento exterior. Só o que se sente basta. Nas experiências espirituais mais profundas esse sentimento de comunhão acontece em todos os níveis antes citados, e um canal de conexão com forças espirituais superiores se abre... No 2 de copas esse amor transbordante se polariza para que seja vivido no âmbito mais mundano e terreno do amor recíproco e companheiro, e assim chega-se ao 3 de copas com a sensação de que a vida é só júbilo, tudo o que nos vem é grato, e celebra-se todos os resultados por mais simplórios que pareçam aos olhos alheios. Mas, como o movimento da água é para baixo e para o centro, no 4 de copas nos recolhemos com nossos sentimentos como numa profunda meditação, e nos purificamos das influências exteriores. E então, subitamente percebemos que tudo que vivemos até aquele momento ou não representa mais nada, ou não traz mais satisfação, e despertamos desapontados no 5 de copas
Dentro da natureza da água sonhar e rememorar é inevitável, e passamos a idealizar um outro encontro ou a alegria em algo vindouro, mas com as expectativas do passado, e esse é o mundo do 6 de copas. Então, no 7 de copas, nossa busca por prazer e alegria nos leva a um mundo de confusões emocionais, buscas ilusórias e muitas vezes escapistas, falta de perspectiva e direcionamento, quando não de vícios e devassidão. 
Na dimensão lúcida do 8 de copas, assim como no arcano de A Justiça, despertamos para o que realmente estamos fazendo, e saímos em busca de algo que faça mais sentido e que soe mais verdadeiro a nossa alma, o que poderá envolver, ou não, algum sofrimento. Isso depende do nível de envolvimento com as ilusões vividas. 
No 9 de copas reconhecemos então que tudo o que precisamos sempre esteve ao nosso alcance, e que podemos desfrutar de tudo desde que não tentemos nos apegar a nada, entendendo que a evolução continua e que muitos mundos esperam por nós. Assim evitamos a indolência, vício típico do elemento água. Então encontramos a experiência de máxima satisfação e reconhecimento interior do 10 de copas, onde reconhecemos que toda a felicidade no aqui e no agora. A dualidade cessa, e estamos plenos na situação em que nos encontramos, como um Mestre em seu Nirvana.

Naipe de Espadas

O 10 de espadas (Ruína),
do Thoth tarot.
Tanto o Thoth Tarot de Aleister Crowley, quanto o Rider Waite, mostram muito bem como a mente opera em sua busca pela verdade, e no exercício da vontade e do arbítrio para empreender tal busca.
No mundo dual e conflituoso da mente, o Às de espadas traz um reconhecimento súbito, mas profundo, da verdade. Todas as dúvidas se dissipam e avançamos com ela como um sol a nos guiar em meio à escuridão. Clareza e perfeição sem máculas emanam de nossa consciência. Entretanto, como permanecer nesse nível, e em perfeita harmonia com ele, é para uns poucos iluminados, a dualidade da mente emerge no 2 de espadas se perguntando: “será mesmo?”. A verdade pessoal ao se confrontar com a do outro se estilhaça, ou pelo menos se divide em duas partes, e requer remissão e decisão. No 3 de espadas o impasse não pode mais ser protelado, e somos compelidos a agir segundo a nova perspectiva que se apresenta, o que sempre é doloroso! Não se abandona um aspecto da verdade que serviu como guia sem se viver uma espécie de luto... E no 4 de espadas a mente precisa de repouso e reflexão, como um doente convalescendo, ou alguém que se recupera de um luto... Dividir e comparar é da natureza da mente, e nesse momento de reflexão emerge o arcano do 5 de espadas, onde comparamos nossos resultados com os de outras pessoas, ou os nossos próprios planos e as expectativas criadas com o que de fato conseguimos realizar, e muitas vezes a sensação é de derrota pessoal e tempo perdido. Por ser muito influenciada pelo meio em que vive, a mente muitas vezes escolhe a opção de servir às demandas exteriores e se sobrecarrega de responsabilidades que imagina serem suas, o que faz a experiência do 6 de espadas ser sufocante. 
No 7 de espadas já não somos mais nós mesmos, mas um acúmulo de papéis sociais e conquistas que visam manter uma posição de status, muitas vezes forjada com mentiras, e tendo como válvula de escape uma vida secreta mantida com constrangimento. A lucidez se debate no 8 de espadas entre tudo o que considerou-se verdadeiro até o momento, autocobranças e autocríticas fazem-nos sentirmos culpados por não termos vivido nossas vidas por um lado, e por outro por ter de abandonar tudo e todos que nos seguiram na senda trilhada até o momento. No 9 de espadas não há uma solução clara para o impasse, é preciso mergulhar na dor para encontrar nela o antídoto contra o veneno que nós mesmos criamos.
Por fim, no 10 de espadas, a morte dos conceitos seguidos é inevitável! A mente anseia por renovar a si mesma, pois a sua busca é pela verdade, uma verdade que possibilite uma explicação para a vida! Por isso seus processos serem sempre tortuosos e dilacerantes, pois a mente cria mecanismos e se apega a eles, e assim é até que as dúvidas dilacerantes cessem e a mente iluminada se abasteça de si mesma, leve e flexível, observando o fluxo do todo ao retornar e permanecer na clareza do Às de espadas!

Naipe de Ouros

O 9 de ouros (O Zênite),
do Tarot of the Spirit.
Tanto Crowley quanto Waite trabalham neste naipe a ideia de trabalho e construção, bem como da ciclicidade da terra, enquanto as autoras Pamela Eakins em seu Tarot of the Spirit, Vicki Noble em seu Motherpeace Tarot, e Ma Deva Padma em seu Tarot Zen, trabalham o conceito de que neste mundo, e na comunhão com ele, é que se dá todo o desenvolvimento e amadurecimento da jornada espiritual.
A natureza da terra é concreta e cíclica, além de cheia de possibilidades, e no Às de ouros as possibilidades guardadas dentro de nós mesmos (a terra de nossas vidas) se expressam fluentemente, e tornam possíveis a concretização de qualquer coisa! Mas, lembrando que a natureza da terra e da realidade são cíclicas, o 2 de ouros vem nos mostrar que adaptabilidade à vida e aos ciclos da vida e da natureza são fundamentais. O que não significa abandonar conceitos e valores próprios, mas adaptá-los para se extrair o máximo de cada experiência e de nós mesmos. 
Com isso a dimensão do progresso, do crescimento, e da construção sólida e precisa se manifesta no 3 de ouros, e avançamos em sintonia com os ritmos da terra e da existência, e totalmente guiados por esses ritmos. Então encontramos no 4 de ouros a maravilhosa sensação de segurança que nossa criança interna tanto necessita, mas quase que invariavelmente essa segurança torna-se excludente, pois nos apegamos a ela, e evitamos a aproximação de outros que possam ameaçar ou roubar o que conquistamos. Passamos então a sentir muito medo. A vida é dinâmica, e a segurança de todos os 4 é uma ameaça a esse dinamismo. É preciso avançar! Logo entramos no 5 de ouros e podemos viver um inexplicável sentimento de menos valia, como se tudo o que somos só tivesse sentido pelo que possuímos. Se não se possui nada ou muito pouco então, isso só se agrava. E se perdemos tudo o que conquistamos passamos a ver a nós mesmos como uma criatura de menor importância e de pouco merecimento... 
No 6 de ouros aprendemos então a fazer concessões, a ver outras perspectivas, a ouvir quem não ouvíamos, e se isso for verdadeiro, e não uma manobra para a aceitação dos outros, então é simplesmente transformador. Entramos na dimensão do 7 de ouros onde entendemos que tudo tem um ritmo próprio, uma hora certa para tudo, inclusive nós mesmos, e que não chegamos a lugar algum avançando sobre esses ritmos. Como todos os 7 têm uma propensão ao exagero, a condescendência permissiva é uma perigosa possibilidade! 
Na dimensão lúcida do 8 de ouros o trabalho de reconstrução de si mesmo recomeça, com a simplicidade do “menos é mais”, com a disposição de reaprender com toda a humildade e devoção... Há, porém, o risco da subserviência, o que pode fazer com que o discípulo nem perceba quando já tiver se transformado num Mestre. No 9 de ouros, a consciência brilha com tudo o que amadureceu ao longo da sua jornada, houve grandes vitórias sobre si mesmo. Não somos mais vistos como uma estrela ou um fenômeno como no 6 de paus, mas como um Mestre ou um Sábio reconhecido que viveu e venceu a luta contra o pequeno “eu”. 
No 10 de ouros a consciência agora sabe que é a cocriadora da vida, e que pode manifestar o que desejar sem ignorar a natureza divina de tudo, nem as leis naturais, mas em sintonia com essas forças, fluindo com seus ciclos e em sintonia com suas essências. Descobre-se então que Deus/Consciência/Natureza são a trindade de que falam os mitos de todas as grandes civilizações, e as divindades de todas as religiões do homem!

Leia também:

O Naipe de Paus - A Energia do Fogo 

O Naipe de Copas - A Sensibilidade da Água 

O Naipe de Espadas - A Inteligência do Ar 

O Naipe de Ouros - O Poder da Terra