sexta-feira, 5 de abril de 2019

A Cruz Hermética e o Tarot...

A Cruz Hermética, ou Rosa Mundi.

A Rosa Mundi, ou Cruz Hermética, é um símbolo da Sociedade Rosa Cruz que também ilustra o verso de dois baralhos de uma outra ordem oculta, a Golden Dawn. Esses baralhos são o Tarot da Golden e o Thoth Tarot de Aleister Crowley. Independentemente das razões que levaram os autores desses dois tarots a colocarem esse símbolo em seus baralhos, eu só tenho de concordar de que é perfeita a junção desse símbolo à linguagem do tarot! A Rosa Mundi começa com seus dois braços cruzados, um vertical e o outro horizontal, sinalizando a entrada do homem na dualidade da matéria, onde tudo se divide em duas polaridades, como bem/mal. luz/sombra, consciente/inconsciente, macho/fêmea e assim por diante. Essa dualidade é o grande desafio que a alma enfrenta a cada nova incursão reencarnatória. A nossa incursão pelo mundo da matéria não se resume, entretanto, a viver esta dualidade e sofrer com ela, mas sim em harmonizá-la para se obter o máximo desta combinação. Como quando integramos em nossa essência a abordagem racional e a intuitiva, a mente analítica e a sintética, o amor e o rigor, e assim por diante. As leituras de tarot são, em última instância, um mergulho nessas dualidades geradoras de conflitos, cuja finalidade é justamente a de se achar um ponto de integração e harmonização para a resolução do conflito, através da compreensão do seu propósito para a consciência. Os quatro braços formados pela cruz central nos remetem aos quatro quadrantes da magia e das quatro estações, que por sua vez aludem à passagem do tempo dentro do processo reencarnatório. As quatro fases da vida, infância, juventude, maturidade e velhice que também se repetem nas estações indicando tanto que morremos um pouco a cada ciclo de um ano, quanto que a cada novo ciclo temos a oportunidade de renascimento através da expansão da consciência sobre nós mesmos e os fatos do mundo que nos cerca. É na interação entre esses dois processos da existência que cada homem tem um propósito a cumprir! 
Wang desenha nos braços da cruz do tarot da Golden os quatro símbolos alquímicos dos elementos. No modo como a cruz aparece no verso do tarot desenhado por Frieda Harris sob a direção de Crowley, há uma sucessão de pétalas que se interpenetram aprofundando-se no âmago da grande cruz até a rosa em seu centro. Esse simbolismo revela que a cada renascimento proposto pelos ciclos naturais o indivíduo aprofunda-se em si mesmo, na compreensão de sua essência, propósito e natureza até a libertação da roda reencarnatória. No tarot da Golden Robert Wang desenhou uma Árvore da Vida cabalística no centro da cruz, pois que na Rosa Mundi original aparecem as vinte e duas letras cabalísticas nas pétalas que envolvem a cruz central, indicando que o entendimento da relação homem/universo, ou homem/Deus é o epicentro de nossa viagem interior. Encontrar o propósito de nossas vivências individuais, e o seu papel dentro do grande quadro em que nos encontramos é, com certeza, uma das funções mais profundas da simbologia dos arcanos. Quando interpretadas por alguém com conhecimento e habilidade para extrair tais informações de suas imagens arquetípicas.
Dentro do hermetismo cristão, proposto pelo símbolo Rosa Cruz, esse cerne da cruz simbolizaria a Mônada individual, a presença da divindade em cada um de nós, também conhecida como a Divina Presença ou como o Cristo Interno. Ao nos aproximarmos dessa essência desvendando o significado de nossas vidas perfazemos o caminho que as antigas escrituras judaico-cristãs chamaram de “o retorno à casa do Pai”. Assim, o Juízo Final revelar-se-ia não como uma catástrofe para o julgamento de toda a humanidade, mas sim como uma consciência profunda do si mesmo em sua trajetória espiritual. A sequência de imagens dos arcanos do tarot simbolizam exatamente isso, a jornada de autodescoberta de toda a humanidade, tanto quanto de cada pessoa sobre este mundo. Ao retirarmos as cartas numa leitura estamos revelando em que ponto dessa jornada estamos individualmente, e em que desafios travamos nossa luta por esclarecimento e compreensão.
A Cruz Hermética do Golden Dawn
tarot, de Robert Wang.
A consideração dos quatro braços da cruz mais a Mônada nos remete ao símbolo do pentagrama, cuja representação mais antiga remonta à Mesopotâmia, há mais de três mil anos, e que aparece representado nos quatro braços da cruz hermética! Os pitagóricos o consideravam o símbolo do homem perfeito e em perfeito equilíbrio, com os pés bem plantados no chão (este mundo) e a cabeça apontando para os céus (o mundo transcendente). A inversão deste símbolo representaria a inversão do fluxo de crescimento e expansão da consciência, uma vez que o homem estaria com suas faculdades de percepção superiores embotadas por seus instintos inferiores de posse, cobiça e apego. Ou seja, seus olhos não conseguiriam enxergar nada para além deste mundo e seus apelos imediatistas. No braço inferior da cruz, acima do pentagrama, vemos a estrela de seis pontas, conhecida também como “Escudo Supremo”, representando a cosmologia da antiguidade, trazendo em si o Sol cercado dos outros seis outros corpos celestes conhecidos: Saturno, Júpiter, Vênus, Lua, Mercúrio e Marte. Esses planetas representam, segundo a Cabala, as sete sephirot inferiores da Árvore da Vida, onde se dá a maior parte do desenvolvimento humano na sua viagem rumo ao encontro com o divino em Kether.
A Cruz Hermética do Thoth tarot,
de Aleister Crowley.
Na cruz hermética aparece também os símbolos dos três elementos filosóficos da Alquimia, o enxofre (a criação), o mercúrio (a expansão), e o sal (a manutenção ou preservação). Indicando que os processos de transformação, representados pelo enxofre, movimentam energias subjacentes que acompanham a vida material, representadas pelo mercúrio, para revelar a essência eterna de toda criação, representada pelo sal. Podemos associar esse simbolismo à ideia de que toda crise, como a força transformadora que é, traz em si um significado mais profundo que tanto pode ser revelado quanto desvendado pelo simbolismo do tarot. Por fim, na Rosa Mundi original aparece também a palavra I.N.R.I que possui muitas interpretações, tanto no Hermetismo cristão quanto nos textos alquímicos. Essa palavra teria sido escrita numa placa sobre a cabeça de Jesus como um deboche dos soldados romanos, e significaria “Jesus nazareno rei dos judeus”, mais tarde seria interpretada como “O Filho do Rei”, e essa seria uma interessante percepção dessa palavra, já que Kether é a sephira cabalística da divindade e da origem espiritual da vida, e é representada por uma coroa. Reforçando que toda busca do si mesmo é uma busca por comunhão com a divindade. Essa inscrição foi suprimida tanto por Wang quanto por Crowley, da mesma forma que a própria divindade é ignorada por muitos ocultistas, e também, é claro, por muitos tarólogos. Os séculos de deturpação dos ensinamentos do Cristo, que seguiram uma orientação muito mais dogmática-religiosa-institucional do que espiritual-libertária-individual ajudou a criar toda essa lamentável resistência e preconceito.